sábado, 25 de março de 2017

Gravidade. Tess Gerritsen. « Também viu sinais de humanidade: um pedaço de corrente enrolado ao redor de uma âncora perdida e uma garrafa…»

Cortesia de wikipedia e jdact

O Mar. Fenda de Galápagos. 0,30º S, 90,30º W
«Ele pairava à beira do abismo. Logo abaixo, estendia-se a escuridão aquosa de um mundo gelado onde o sol jamais penetrava, onde a única luz eram as centelhas passageiras de criaturas bioluminescentes. Deitado de barriga para baixo no fundo da apertada cabine do Deep Flight IV, cabeça aninhada no cone frontal de acrílico transparente, o dr. Stephen Ahearn tinha a inebriante sensação de flutuar, livre, na vastidão do espaço. Iluminada pelas luzes das asas do submarino, viu a suave e contínua precipitação de partículas de matéria orgânica provenientes das águas repletas de luz bem mais acima. Eram corpos de protozoários, afundados em milhares de metros de água até o seu túmulo final no fundo do mar. Atravessando a chuva fina de partículas, ele guiou o Deep Flight ao longo da borda do desfiladeiro submarino, mantendo o abismo a bombordo, o solo do planalto logo abaixo do aparelho. Embora os sedimentos fossem aparentemente estéreis, havia provas de vida em toda a parte. Marcadas no fundo do mar, viu trilhos e sulcos provocados por diferentes criaturas, agora ocultas e em segurança sob um manto de sedimentos. Também viu sinais de humanidade: um pedaço de corrente enrolado ao redor de uma âncora perdida e uma garrafa de refrigerante semi-submersa no lodo.
Vestígios fantasmagóricos do mundo alienígena lá em cima. De súbito, divisou uma imagem surpreendente. Era como atravessar um bosque submarino de troncos de árvores carbonizadas. Os objectos eram chaminés hidrotermais, tubos de 6 metros de altura formados por minerais dissolvidos que saíam de fendas na crosta terrestre. Usando os controles, manobrou o Deep Flight lentamente para estibordo de modo a evitá-las. Cheguei às chaminés hidrotermais, disse ele. Estou me movendo a 2 nós, chaminés de águas termais a bombordo. Como está o aparelho?, disse a voz de Helen no seu telefone de ouvido. Muito bem. Quero uma dessas belezinhas para mim. Ela riu. Pois então se prepare. Terá de pagar caro, Steve. Já viu o campo de manganésio? Deve estar bem à sua frente. Ahearn ficou em silêncio um instante enquanto perscrutava as redondezas. Pouco depois, falou: estou vendo agora.
Os nódulos de manganésio (Mn) pareciam pedaços de carvão espalhados pelo fundo do mar. Com a sua estranha, quase bizarra lisura, formados por minerais que se solidificaram ao redor de pedras ou grãos de areia, eram uma fonte muito valiosa de titânio e de outros metais preciosos. Mas ele ignorou os nódulos. Estava em busca de algo ainda mais valioso. Vou entrar no desfiladeiro, disse ele. Ele aproximou o Deep Flight da borda do planalto. Quando a sua velocidade aumentou para 2,5 nós, as asas, projectadas para produzir o efeito inverso das de um avião, arrastaram o submarino para baixo, e ele começou a sua descida no abismo. Mil e cem metros, contou. Mil cento e cinquenta... Cuidado com as paredes. É uma fenda estreita. Está monitorando a temperatura da água? Começa a aumentar. Está perto de 13 graus agora. Ainda está longe da chaminé. Mais 2 mil metros, e estará cercado de água quente. Subitamente, uma sombra passou bem diante de Ahearn. Ele se assustou e sem querer esbarrou nos controles, fazendo o submarino rolar para estibordo. O choque contra a parede do desfiladeiro fez resplandecer todo o casco». In Tess Gerritsen, Gravidade, 1999, tradução de Alexandre Raposo, Editora Record, 2009 / 2012, ISBN 978-850-108-343-2.

Cortesia de ERecord/JDACT