quarta-feira, 29 de março de 2017

À volta do casamento do infante Pedro. Douglas Mota Xavier Lima. «Assim, é importante notar que os quatro casamentos dos filhos legítimos de João I e Filipa ocorreram nos anos de 1420»

Cortesia de wikipedia e jdact

«(…) João I e dona Filipa tiveram oito filhos, dos quais dois faleceram. Dos seis infantes, apenas dois não casaram, Henrique e Fernando, mesmo tendo existido oportunidades nesse sentido. O primeiro a casar-se foi o penúltimo filho, o infante João, em Novembro de 1424, matrimónio que uniu o infante à sua sobrinha, única filha do conde de Barcelos, dona Isabel. No entanto, tal enlace, somado ao de Afonso com a filha do Condestável, representa uma tendência secundária das uniões estabelecidas pelos filhos de João I, visto que de oito filhos (legítimos e bastardos), quatro casaram fora de Portugal. A partir das fontes acerca das negociações matrimoniais de Afonso, dona Beatriz e do infante João, pode-se entrever que estas transacções não conheceram delongas, sendo o casamento da infanta com o conde de Arundel o que mais se protelou. A constatação reitera-se na observação das negociações que envolveram os matrimónios de Duarte I, Pedro (o Regente) e dona Isabel, pois este segundo conjunto de casamentos reafirma a tendência de que a procura de um marido ou de uma esposa por um príncipe era um processo longo e complexo. O estabelecimento de dois conjuntos de casamentos, sendo o primeiro representado por Afonso, dona Beatriz e João, e o segundo por Duarte I, Pedro e dona Isabel, permite ainda que se delimitem distinções entre as consequências de cada um dos grupos de matrimónios para a dinastia de Avis. Acredita-se que ambos reforçaram os laços avisinos dentro e fora de Portugal, contudo também reflectem momentos diferentes do reinado de João I. Os primeiros ocorreram num período de busca de afirmação e legitimação dinástica, para o qual a aliança do rei com os Lancaster (1387) já tinha contribuído, com os problemas internos apresentando-se como difíceis obstáculos, e o segundo conjunto de consórcios deu-se num contexto de consolidação e ampliação das alianças externas existentes até então.
Assim, é importante notar que os quatro casamentos dos filhos legítimos de João I e Filipa ocorreram nos anos de 1420. Chama ainda mais atenção o facto de três casamentos terem ocorrido entre Setembro de 1428 e Janeiro de 1430. Destes, o enlace do herdeiro (1428) foi investigado no citado estudo de Dias Dinis, no qual se expõe a importância do matrimónio para as relações ibéricas do período. O principal consórcio foi o de dona Isabel (1430) com o duque da Borgonha, que consolidou a presença portuguesa no norte europeu. E o casamento de Pedro? Tal como outros aspectos da vida do duque de Coimbra, o enlace mostra-se um obscuro, porém crucial, momento na trajectória biográfica do viajante das Sete Partidas.
Portanto, para finalizar as considerações sobre a política matrimonial de João I, afirmamos que os casamentos dos anos de 1420 foram reflexo de uma nova etapa da diplomacia portuguesa. A posição interna de Avis já estava estabilizada e a aliança inglesa estruturada e reafirmada com o consórcio de Beatriz. A conquista de Ceuta (1415) tinha permitido a construção de uma imagem do reino e da dinastia reinante articulada com os valores cristãos e com a defesa da Cristandade, elementos que favoreciam a honra da família real avisina no cenário das casas principescas. Por fim, os casamentos do período demonstram o esforço do reino de Portugal em consolidar-se no cenário político ibérico, mormente através da aliança com Aragão e, ultrapassando este quadro diplomático tradicional, enrijecer os laços com o mar do Norte, por meio do enlace com o ducado de Borgonha.
A fim de organizar a exposição sobre o enlace do Infante, orientaremos a discussão de acordo com os seguintes tópicos: as anteriores propostas de casamento; o momento do enlace, como etapa da vida de Pedro; a escolha da noiva, dona Isabel de Urgel; o casamento e as suas consequências. As primeiras menções sobre propostas de aliança matrimonial envolvendo o infante Pedro aparecem em dois documentos do rei Martin de Aragão, datados de Aabril de 1410, no qual o monarca expõe o interesse de casar a infanta dona Leonor de Urgel, ou com Duarte ou com o Infante. Novas alusões surgem alguns anos depois, de acordo com o texto da Crónica da Tomada de Ceuta, ao descrever o envio dos embaixadores portugueses à Sicília. Esta missão teve como pretexto tratar do matrimónio proposto pela rainha viúva, dona Branca, com o infante Duarte, ou com Pedro. De acordo com Zurara, após descartarem o avanço das negociações com o príncipe herdeiro, os enviados portugueses afirmaram que João I via com prazer que o casamento da rainha se concretizasse com o secundogénito. Contudo, ainda segundo o cronista, a rainha ficou mui pouco contente com a posição da embaixada, visto que lhe parecia que seu estado receberia abatimento, mandando ela, primeiramente, tratar casamento com o infante Duarte, que era herdeiro do reino, e tornar a casar com o infante Pedro que era sojeito a seu irmão por razão de sua primeira nascença». In Douglas Mota Xavier Lima, À volta do casamento do infante Pedro, UFOdoPará, ICE, PCHumanas, Santarém, Brasil, Revista Medievalista, Nº 21, Janeiro-Junho 2017, Universidade Nova de Lisboa, FCS e Humanas, FC e Tecnologia, ISSN 1646-740X.

Cortesia da RMedievalista/FCT/JDACT