quarta-feira, 12 de outubro de 2016

A Sombra da Luz. Nana Pauvolih. «Nascemos altas, esguias, com um corpo naturalmente bem feito e longos cabelos ruivos. Aí acabavam as semelhanças. Ela tivera sardas e olhos castanhos…»

jdact e wikipedia

Prólogo. 6 anos antes
«Coisa que eu mais gostava na vida era quando minha irmã ligava para mim. Para uma garota de 15 anos que morava no interior do Rio de Janeiro e que era desprezada pelos pais, aqueles telefonemas mostravam que para alguém eu era importante. E confiava no que minha irmã de dezanove anos dizia, que um dia viria buscar-me para morar com ela. Monalisa! Exclamei, feliz da vida, atendendo o telefone móvel barato que ela me dera de presente para poder conversar e matar a saudade. Matar! A voz saiu abafada, arfante, com um pavor tão grande que fiquei imóvel, sentindo que havia algo errado. Lisa? Ajude-me... Polícia... Ele vai ... Havia barulho ao fundo e parecia correr, respiração pesada, o pânico evidente. O que está acontecendo? Lisa? Monalisa? Eu andava pelo quintal da casa, com o coração acelarado. Escute, Dani... Ele ..., com raiva... Escolhi o outro... O que amo... Me separar... Chorava, desesperada, numa ligação ruim e picotada. Chame... Polícia... Praia... Ele vai-me matar! Calma, que praia? Quem vai te matar? Lisa, pelo amor de Deus! Amo-o... outro me ama... Socorro! Quer separar-me... dele... A ligação ficou muda. Comecei a gritar: não! Ai, meu Deus! Não! Não!

O preparo de uma vingança. Dias actuais
Eu tinha um quarto no meu apartamento só dedicado a eles. Algumas pessoas, se vissem as fotos colocadas no painel na parede, as anotações sobre a mesa e as filmagens, diriam que eu era completamente obcecada. E não estariam erradas. Era mesmo. Mas agora, que finalmente tudo estava preparado e que entraria no mundo deles, devia ter mais cuidado com tudo aquilo. Se os meus planos funcionassem, talvez até me visitassem em casa. E nunca poderiam ver aquilo. Mesmo deixando o quarto trancado, seria um risco. Assim, comecei a guardar em caixas de madeiras compradas para aquela finalidade e depois as fechei com cadeado e pus dentro de armários. Quanto mais dificultasse, melhor. De qualquer forma, já sabia de cor tudo que havia ali. Eram anos de pesquisas e investigações sobre os sócios e melhores amigos: David Tabasco e Gabriel Campanari. Eu olhei-me no espelho, preparada para conhecê-los pessoalmente. Seria a primeira vez a ser apresentada oficialmente a ambos. E embora soubesse tudo sobre eles, estava nervosa. Pois finalmente ia começar. Alguns poderiam dizer que era justiça. Mas eu sabia que era vingança. Um dos dois era o assassino da minha irmã e eu descobriria. Não para entregá-lo à polícia e saber que logo estaria nas ruas, principalmente pelo facto de ter dinheiro. Não. Eu o mataria. Por maldição ou simplesmente genética, tanto eu quanto minha irmã fomos presenteadas com uma beleza de chamar a atenção. Nascemos altas, esguias, com um corpo naturalmente bem feito e longos cabelos ruivos. Aí acabavam as semelhanças. Ela tivera sardas e olhos castanhos. Minha pele era branca, sem nenhuma marca. E meus olhos esverdeados. Como sabia que nossos cabelos eram idênticos, eu os pintei de negros. Agora essa era minha cor. Afinal, não podiam sequer desconfiar que eu tinha algum parentesco com Monalisa. Apesar de ter apenas vinte e um anos, eu era madura e decidida. Inteligente por natureza, estudei e fiz cursos, preparando-me para aquele momento. Fui paciente. Era essa minha maior qualidade. E naquela manhã começaria. Armei todas as peças do xadrez. Tinha chegado a hora de movê-las. Usando um vestido azul-marinho, sapatos de salto vermelhos e cabelos presos num chinó, eu sabia que estava ao mesmo tempo elegante e sensual. E foi assim que saí do meu apartamento e segui, com meu carro, para a sede do escritório da agência de viagens Campanari &Tabasco, em Ipanema. Há meses eu procurava uma brecha para poder conseguir trabalhar lá. Mas não podia ter qualquer cargo. Tinha que ser um que me pusesse em contacto directo com os dois donos. Então a oportunidade apareceu. Fátima, a secretária particular deles, ficou grávida. Quando eu soube, entendi que ela precisaria se afastar para ter o bebé e entrar de licença maternidade. Alguém teria que entrar temporariamente no lugar dela. Só podia ser eu. Mas depender de uma entrevista e de ser escolhida seria arriscar muito. Então armei o meu plano. E deu certo. Sabia que Fátima sempre almoçava no mesmo lugar. Comecei a frequentá-lo no mesmo horário. Um dia esbarrei nela e puxei assunto. No outro, sentei à sua mesa. No terceiro já conversava com ela. E quando viu, já era minha amiga. Contei que procurava emprego, falei de minhas capacidades, da dificuldade de conseguir algo bom. Fui pondo a sementinha aos poucos, até que ela teve a brilhante ideia de me indicar para substituí-la com seus patrões, quando precisasse afastar-se. E lá estava indo eu para a entrevista definitiva com ambos, já que na semana seguinte Fátima já entraria de licença». In Nana Pauvolih, A Sombra da Luz, Wikipédia.

Cortesia de Wikipedia/JDACT