sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Navegações Portuguesas: Parte XIII. João de Lisboa. «O Tratado da Agulha de Maear foi muito divulgado na época e muitos pilotos possuíam cópia das suas indicações, relativamente aos problemas das agulhas de bordo». O mais antigo texto conhecido acerca da forma de determinar a declinação magnética de um local


World map by João de Lisboa, in a book signed 1514.
(yellow triangle is to be skipped and glued by the blue line spots)
Cortesia de alvor-silves


Com a devida vénia a António Gonçalves e ao Instituto-Camões, publico algumas palavras.

João de Lisboa
«Foi um dos pilotos portugueses mais conhecidos do seu tempo. Quanto à data do seu nascimento ela situa-se, muito provavelmente, no início do segundo quartel do século XV, ou seja, ainda durante a vida do infante D. Henrique. Como foi prática durante muito tempo, João de Lisboa recebeu a sua instrução, como todos os outros pilotos coevos, a bordo dos navios. Apesar de diversos historiadores colocarem João de Lisboa nas armadas de Vasco da Gama e Pedro Álvares Cabral, ou mesmo a escrever o dito roteiro da primeira viagem de Vasco da Gama, atribuído a Álvaro Velho, nenhuma destas acções se encontra minimamente fundamentada para que o possamos admitir, sem reservas.
No entanto, sendo João de Lisboa um bom e experiente piloto à data da realização das viagens acima mencionadas, não podemos excluir a hipótese de nelas ter participado. Segundo Varnhagen, citando o Resumo histórico chronologico e politico do descobrimento da América, de Alexandre Gusmão, João de Lisboa terá participado na expedição à costa brasileira, em 1501, capitaneada por Gonçalo Coelho. A sua estada em terras brasileiras é quase uma certeza pois em várias cartas do século XVILázaro Luís e Fernão Vaz Dourado, se encontra referenciado, no norte do Brasil, na latitude dos 3º Sum rio com o seu nome. No ano de 1506 João de Lisboa terá partido para o Oriente, talvez pela segunda vez, na armada de Tristão da Cunha.

Em data incerta, 1513?, foi nomeado piloto-mor de Portugal e participou, possivelmente como piloto-mor, na expedição contra Azamor, comandada pelo duque de Bragança, D. Jaime. Cerca de 1514 compôs em Lisboa o seu Tratado da Agulha de Marear, com base nas suas observações levadas a cabo em Cochim, nos Açores e noutros locaisCom a morte de Gonçalo Álvares, foi nomeado piloto mor da navegação da Índia e mar oceano, por carta de 12 de Janeiro de 1525. Voltou a embarcar para o Oriente onde provavelmente faleceu, em 1526. Prova disso mesmo é o facto de o seu cargo ter sido entregue, em 15 de Novembro desse ano, a Fernão de Afonso.

A map by João de Lisboa, in a book signed 1514.
(magenta squares show the portuguese/moor flag castles)
Cortesia de alvor-silves

O seu Tratado da Agulha de Maear  foi muito divulgado na época e muitos pilotos possuíam cópia das suas indicações, relativamente aos problemas das agulhas de bordo e ao seu noroestear/nordestear. Prova do que afirmamos é a existência de cópias do citado documento, ainda que com pequenas alterações, que se encontram nos Livros de Marinharia atribuídos a André Pires e Bernardo Fernandes. Relativamente à declinação magnética o autor critica o facto de os antigos não colocarem os ferros das agulhas, os ímanes alinhados com a flor-de-lis. Isto permitia-lhes que a agulha indicasse o norte verdadeiro, pollo do mumdo,  no local onde ela era construída, em vez de indicar o norte magnético.
Constam também no seu texto as recomendações de João de Lisboa para se poder determinar, com rigor, a declinação magnética. É que não bastava azimutar a estrela Polar. Era necessário esperar que a estrela estivesse no meridiano do lugar. Isto, porque nessa altura, a estrela Polar estava afastada do Polo celeste cerca de 3º40’, número que era arredondado para os 3º 30’. Hoje a estrela Polar está afastada do pólo cerca de 45’. Em função da declinação magnética, segundo João de Lisboa, o piloto podia determinar o meridiano em que se encontrava.

Cortesia de cvcinstitutocamoes 

Este Tratado é o mais antigo texto conhecido acerca da forma de determinar a declinação magnética de um local. Para além disso descreve, de uma forma pormenorizada, os passos que devem ser dados na construção de uma agulha de marear. O códice tido como padrão, e que se encontra hoje nos ANTT, data de c.1550, mas no seu título é afirmado que este fora «achado», por João de Lisboa, em 1514. Nesta cópia, para além de se encontrar incompleta, o copista repetiu um capítulo com os números VII e IX, relativo à localização do meridiano vero». In António Gonçalves, Instituto Camões.


Bibliografia
  • ALBUQUERQUE, Luís de, O «Tratado da agulha de Marear» de João de Lisboa; reconstituição do seu texto, seguida de uma versão francesa com anotações, Coimbra, IICT, 1982;
  • LISBOA, João de, Livro de Marinharia – Tratado da Agulha de Marear, copiado e coordenado por Jacinto Ignacio de Brito Rebello, Lisboa, Imprensa de Libanio da Silva, 1903;
  • VITERBO, Sousa, Trabalhos Náuticos dos Portugueses – séculos XVI e XVII, Lisboa, INCM, s.d..
Cortesia do Instituto Camões/JDACT